INDÚSTRIA CULTURAL E EDUCAÇÃO INFANTIL: O PAPEL DA TELEVISÃO
INDÚSTRIA CULTURAL E EDUCAÇÃO INFANTIL: O PAPEL DA TELEVISÃO | |
Hugo Leonardo Fonseca da Silva1
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Fonte: http://www.proec.ufg.br/revista_ufg/infancia/F_cultural.html |
Resumo: Esse artigo tem como objetivo
realizar um exercício reflexivo sobre determinantes da Indústria Cultural na
formação da criança de até 06 anos, enfatizando a análise sobre o papel da
televisão nesse processo. Para isso, discutimos o conceito de infância como
consumidora potencial dos bens constituídos pela Indústria Cultural, buscando
evidenciar o papel deformativo que a televisão exerce na formação ideológica
para o consumo. Por fim, o texto aborda as contradições inerentes ao uso da TV
nos processos educativos da infância, indicando que a mediação pedagógica dos
educadores necessita materializar-se no sentido de ensinar as crianças a verem
TV de maneira refletida e crítica.
Palavras-chave: infância; indústria cultural;
televisão.
A
análise do livro “Televisão, criança, imaginário e educação” organizado por Elza
Dias Pacheco (1998) instigou-nos a elaborar uma reflexão mais sistematizada
sobre o papel da televisão na formação de crianças de até 06 anos (Educação
Infantil).
A discussão
sobre a televisão e sua influência na formação das crianças necessariamente
perpassa pela inserção deste tema num determinado contexto sócio-histórico. O
modo de produção capitalista e seus determinantes políticos, econômicos, sociais
e culturais são o ponto de partida para analisar e refletir sobre as relações
entre indústria cultural e infância. É a partir deste momento histórico
que o homem e as relações estabelecidas socialmente (dentre elas a produção
cultural) são objetivados, transformando-se em coisas, em mercadorias
comerciáveis.
A cultura
transformada em produto alienado dos homens é, neste sentido, conformada em
objetos/manifestações produzidos pela indústria cultural integrados aos
interesses do capital de acumulação do lucro e de manutenção do status
quo através de uma formação ideológica das consciências. Os meios de
comunicação têm papel determinante na produção e reprodução do capital através
do amoldamento sobre as consciências dos indivíduos por meio da cultura de massa
em sua versão industrial, seja isto em qualquer um dos veículos de comunicação
de massa que formam um sistema industrial de produção
cultural.
Dentre os
meios de comunicação, a televisão tem se destacado pela sua ampla capacidade de
atingir as diversas classes sociais, disseminando os produtos da indústria
cultural e a ideologia dominante aos diferentes sujeitos
sociais.
Em tempos
de neoliberalismo, a cidadania é subsumida à condição de consumo que os sujeitos
possuem e as diversas instituições da sociedade civil, sejam elas educacionais,
de comunicação, políticas, entre outras, voltam-se para o atendimento dos
interesses do capital. A reestruturação e flexibilização do modo de produção
capitalista envidam a criação de novos nichos de mercado individualizando as
mercadorias produzidas. Neste sentido, a TV tem servido como estratégia de
marketing de tais produtos, bem como na veiculação de uma consciência
ideologicamente voltada pela a lógica de consumo.
As
crianças, neste contexto, aparecem como consumidoras em potencial devido às suas
características de compradoras imediatas e de futuros adultos que serão
inseridos duplamente nas relações comerciais do capital, vendendo sua força de
trabalho e reproduzindo o lucro no consumo (CAPPARELLI, 1998, p. 154). A
exploração de mercados voltados para o público infantil através da produção,
marketing e venda de mercadorias culturais são características da autonomização
deste mercado.
A
televisão, neste sentido, tem contribuído para a (de)formação dos sujeitos
determinada pelas concepções ideológicas do mercado (produtividade,
concorrência, eficiência, competitividade), formando os indivíduos para o
consumo.
Entretanto,
não se pode negar que a TV tem sido um dos poucos “bens culturais” a que a
classe trabalhadora tem tido acesso e que tal meio de comunicação faz parte do
cotidiano e da vida de crianças e adultos, possibilitando, também, o acesso a
informações diversas de vários cantos do mundo globalizado (de produções
artísticas a programações educativas).
Questionamos então: pode a TV atual tornar-se
instrumento de formação cultural das crianças de até 06 anos? O que significa a
criança para a televisão? Quais possibilidades educativas da TV? Os professores
de Educação Infantil têm condições de usar a TV como instrumento educativo?
Estas questões norteiam as reflexões iniciais desenvolvidas neste texto, que não
têm a pretensão de esgotar o assunto, pelo contrário, suscitam novas questões
quanto à relação infância e indústria cultural.
Indústria Cultural, criança e televisão
O conceito
de infância construído historicamente tem caracterizado a criança em diferentes
contextos históricos como um vir-a-ser1, como um ser incompleto em relação
ao adulto (ser completo). Esta idéia trabalha com o preceito de que a criança é
imperfeita e precisa ser formada por modelos de ensino-aprendizagem e pelos
conhecimentos determinados pelos adultos que representam o estágio mais evoluído
de um ser humano.
Tal
perspectiva desconsidera que as crianças sejam sujeitos históricos capazes de
modificarem o mundo e serem dialeticamente por ele modificadas, cabendo-lhes
somente a assimilação passiva dos conteúdos culturais produzidos historicamente
pelo homem adulto. Na sociedade capitalista, a formação cultural das crianças,
intrinsecamente determinada pela divisão social do trabalho, depende da classe
social a que pertencem. Nesse modelo, as crianças burguesas são
instrumentalizadas para dirigir a sociedade e as crianças da classe trabalhadora
formadas para o trabalho. Neste sentido, a cultura é coisificada, tornando-se
produto que serve tanto para a distinção de classes, como para a alienação e
dominação das maiorias.
Cultura,
então, aparece como sendo simplesmente o resultado de um processo, a herança
social, o dado acabado, o objeto estático. Os produtos culturais seriam a
expressão de um modo de vida determinado que, enquanto tal, se explicam e se
justificam. Reduzido a produto das relações sociais, não se incluiriam no
conceito de cultura nem as próprias relações sociais nem os seus determinantes.
(PERROTTI, 1984, p. 15).
A
coisificação da cultura determina a inserção desta no mundo da produção
capitalista, na qual se quantifica, seculariza, normatiza e mercantiliza os bens
produzidos nas relações de trabalho humanamente
significativas.
Desta
forma, a criança assume o papel de consumidora de bens culturais impostos
socialmente, pois somente assim poderá tornar-se um “ser humano evoluído”,
adaptado às regras da sociedade e capaz de assumir suas funções sociais para que
a sociedade funcione em harmonia. Esta concepção compreende a sociedade como
algo estático e harmônico e a cultura como normas, bens e valores postos,
cabendo à criança a incumbência de assimilar e adaptar-se dentro dos moldes
societários estabelecidos hegemonicamente.
Na história
humana, as idéias, o pensamento, as produções e as representações são
determinadas pela classe dominante vigente em cada período histórico. Desse
modo, a cultura exerce uma função domesticadora e coercitiva nas sociedades
divididas em classes, exercendo o papel de veiculação dos conteúdos ideológicos
das classes dominantes para todas as classes sociais. A indústria cultural
cumpre um papel determinante nessas relações de dominação e veiculação
ideológica, num processo que estende a alienação do trabalho para a esfera do
não-trabalho.
A verdade
em tudo isso é que o poder da indústria cultural provém de sua identificação com
a necessidade produzida, não da simples oposição a ela, mesmo que se tratasse de
uma oposição entre onipotência e impotência. – A diversão é o prolongamento do
trabalho sob o capitalismo tardio. Ela é procurada por quem quer escapar ao
processo de trabalho mecanizado, para se por de novo em condição de enfrentá-lo.
Mas, ao mesmo tempo, a mecanização atingiu um tal poderio sobre a pessoa em seu
lazer e sobre sua felicidade, ela determina tão profundamente a fabricação das
mercadorias destinadas à diversão, que esta pessoa não pode mais perceber outra
coisa senão as cópias que reproduzem o próprio processo de trabalho (ADORNO;
HORKHEIMER, 1985, p. 128).
A inserção
da cultura na esfera da produção material, movida pelos mecanismos do mercado
capitalista, atua na superestrutura como instrumentos de controle dominantes. Os
consumidores da cultura produzida (trabalhadores, operários, lavradores,
pequenos burgueses) são submetidos à produção capitalista de tal forma que corpo
e alma são subsumidos ao que lhes são oferecidos pelo sistema hegemônico.
Segundo
Adorno e Horkheimer (1985, p. 128), os conteúdos dos produtos da indústria
cultural impõem aos sujeitos uma paulatina desconstrução da sua capacidade
criativa e de pensamento. Isto se dá mediante a produção e disseminação de
mercadorias culturais apriorísticas, que já são aceitas antes mesmo do crivo de
quem as irá consumir. Este fato tem nos princípios da absolutização e
universalização da cultura burguesa uma forma unilateral de determinação e
controle das possibilidades de se construir uma sociabilidade pautada pelos
interesses das maiorias.
A televisão
assume papel importante na tentativa de incutir nas pessoas uma falsa
consciência escamoteando a realidade, impondo valores, normas e conteúdos
ideológicos de tal forma que estes tornam-se conteúdos únicos da consciência dos
sujeitos. As programações são veiculadas de forma que os sujeitos confundem a
realidade com aquilo que é exibido. Exemplo claro disto são as telenovelas que
povoam o cotidiano das camadas populares, abordando problemas sociais complexos
– preconceito, violência, homossexualismo, corrupção – como situações de fácil
resolução, bastando apenas o envolvimento individual dos sujeitos, veiculando
uma visão deturpada da realidade e superficializando as contradições
sociais.
Adorno
(1995, p. 76) afirma que a televisão, na formação cultural, assume duas funções:
uma deformativa e a outra formativa. A TV, a partir de sua função deformativa,
contribui para a divulgação de ideologias, bem como dirige de maneira equivocada
a consciência dos espectadores, entretanto, este meio de comunicação possui
também um enorme potencial de divulgação de informações e de esclarecimento.
Partindo disso podemos então discutir o papel da televisão na formação cultural
de crianças.
Com o
advento do neoliberalismo e da globalização do capital, o mercado passou a
incorporar todos os segmentos da sociedade sob a lógica do consumo, desde
recém-nascidos até idosos, independente de etnia, raça, credo, classe ou gênero.
O mercado observa no público infantil um consumidor potencial de mercadorias
culturais e não culturais, criando assim condições para se consolidar uma rede
de comércio que atenda a demanda de consumo desse novo público.
Esse
mercado infantil constitui-se desde produtos tradicionais (brinquedos, livros),
até a adaptação de produtos adultos e de produtos de consumo familiar.
Capparelli (1998, p. 154) levanta dados importantes sobre a o avanço das
indústrias culturais voltadas para as crianças.
[…]cerca de
38% da população brasileira, ou seja 55 milhões de pessoas, são crianças com
idade entre 1 e 14 anos (IBGE). Cerca de 25% desse total – 14 milhões, portanto
– pertencem às classes A, B e C (ALPHA, IBGE). As famílias incluídas nas classes
A,B e C tem 8 milhões de filhos entre 2 e 9 anos (IBOPE). A revista Veja, numa
publicação sobre o aparecimento desse novo consumidor, confirmava (...) que o
mercado infantil consumia anualmente 50 bilhões de reais, ou seja, 10% do PIB
brasileiro. As crianças de 2 a 14 anos passam em média 4 horas e 6 minutos
diariamente na frente da televisão. Elas comem de 60% a 80% dos iogurtes, 40%
dos refrigerantes, 30% dos sorvetes, 80% dos achocolatados, 100% dos chicletes
de bola, de 25% a 30% da produção de roupas (...). Representavam um alvo
exclusivo de brinquedos com faturamento anual de 650 milhões de dólares.
Estes
dados corroboram com a perspectiva de que as crianças são hoje consumidoras,
gastadoras e compradoras, tornando-se um segmento autônomo no mercado de
consumo. Esta autonomização acontece de forma relativa, porque as crianças, em
sua maioria, dependem economicamente dos pais, o que reduz sua possibilidade
individual de consumo restrita aos pequenos produtos. No entanto, estratégias de
marketing associam o consumo da criança dentro de uma unidade familiar. Nesta
perspectiva, um programa infantil pode ser assistido coletivamente, por isso se
veiculam comerciais de certos produtos voltados para o público adulto durante
esses programas, ocorrendo, da mesma forma, o inverso.
A indústria
cultural assimilou o mercado infantil, que tem se expandido desde a década de
1980, para a comercialização de bens simbólicos através da segmentação dos meios
de comunicação, por exemplo. Neste sentido, os produtos culturais
comercializados para este público formam uma cadeia inesgotável de produção e
massificação de mercadorias. Exemplo disso são os desenhos animados explorados
pela mídia, produzidos a partir de agenciamento de empresas que irão elaborar,
produzir e comercializar uma infinidade de produtos timbrados com o nome dos
mais novos ídolos infantis da moda.
As
crianças, na perspectiva acima colocada, emergem como potenciais consumidores do
mercado de bens culturais, e a televisão torna-se o principal veículo desse
mercado. As possibilidades de atendimento aos interesses do mercado não se
limitam ao consumo imediato, mas também incute nas consciências infantis a
lógica do mercado e do consumo, formando os consumidores de hoje, amanhã e
sempre.
Educação
infantil, cultura e televisão
Para se
discutir a relação entre cultura, educação infantil e televisão é necessário
atentar para uma série de questões que envolvem os três temas a fim de
articulá-los de forma sistematizada e significativa com o objetivo de traçar
novas possibilidades pedagógicas para a Educação Infantil. No entanto, este
texto se limita em fazer algumas considerações iniciais sobre o assunto com o
objetivo de estabelecer uma leitura crítica sobre estas
relações.
Pacheco
(1998) conduz uma análise, diferentemente de Adorno e Horkheimer (1985), de que
a televisão é um meio de comunicação que amplia as possibilidades imaginárias
das crianças, remetendo ao caráter lúdico e da fantasia que esta possui. Estas
possibilidades remetem a criança a confrontar a realidade vivida com a fantasia
do mundo televisivo, estimulando a criatividade.
É por meio dessa magia, desse
fantástico, que a criança elabora suas perdas, materializa seus desejos,
compartilha sua vida, anima, muda de tamanho, liberta-se da gravidade, fica
invisível e assim comanda o universo por meio de sua onipotência (PACHECO, 1998,
p. 34).
Nesta perspectiva, a TV torna-se então um importante
meio pelo qual as crianças extraem material para interpretar o real e recriá-lo.
Entretanto, é esta própria definição que Adorno (1995) critica, pois as
produções culturais veiculadas pela tevê propagam um mundo pseudorealista que
vela a realidade e dissemina uma realidade ideal.
As
produções infantis não fogem a estas determinações, pois os programas voltados
para este público, com raras e felizes exceções, buscam formar uma criança
adaptada aos valores vigentes, consumidoras de uma cultura fútil e reprodutora
de um mundo irreal. Isto pode ser notado em qualquer sala de aula ou agrupamento
em que as brincadeiras preferidas das crianças são as lutas dos mais novos
heróis da TV.
Mas a
criança não tem capacidade de reelaborar, ressignificar os conteúdos
apreendidos? As respostas apontam que sim, no entanto é necessário saber quais
as condições de educabilidade destas crianças, se seus professores estão
capacitados para fazer a mediação e reflexão sobre os conteúdos emitidos pelos
meios de comunicação, e se estão, se o fazem ou não. A grande preocupação é se
os sujeitos, crianças ou não, sabem ver televisão. É a partir deste pressuposto
que a televisão pode tornar-se realmente educativa.
O papel
principal dos educadores (independente do nível que atua, educação infantil,
ensino fundamental, médio ou superior) diante da televisão, é o de ensinar os
indivíduos a verem TV, possibilitando a estes, instrumentos de criticidade,
programações de relevância, reflexões sobre o assistido na instituição e em
casa, como nos dizeres de Adorno (1995, p. 79).
O ensino acerca desses veículos de
comunicação de massa não deveria consistir apenas em aprender a escolher o que é
certo, e na apreensão do mesmo por meio de categorias, mas, desde o início, este
ensino deveria desenvolver aptidões críticas; ele deveria conduzir as pessoas,
por exemplo, à capacidade de desmascarar ideologias; deveria protegê-las ante
identificações falsas e problemáticas, protegendo-as sobretudo em face da
propaganda geral de um mundo que a mera forma de veículos de comunicação de
massa desta ordem já implica como dado.
A partir
destes princípios é que a televisão pode realizar sua função formativa. O
levantamento das contradições inerentes às programações televisivas e aos
produtos culturais comercializados pelos meios de comunicação, o esclarecimento
sobre a cultura produzida para as massas (cultura de massa), o acesso à cultura
popular e erudita como produtos históricos construídos pelas relações humanas,
bem como a valorização das produções culturais de grupos infantis, são formas de
intervenção que contribuem de maneira relevante para uma Pedagogia da Infância
democrática e de qualidade.
Considerações Finais
Um
importante conceito das teorias marxianas é de que uma outra sociedade, um outro
mundo, um novo homem só poderá emergir da realidade vigente através de suas
contradições. Partindo então desta perspectiva é que desenvolvi a reflexão
contida neste texto.
Não se pode
negar que, dentre os meios de comunicação, a televisão é hoje o de maior
acessibilidade e aceitação social e que por isto tem servido com eficiência aos
interesses hegemônicos de manutenção do status quo. A televisão e suas
programações têm servido como instrumento de veiculação dos produtos da
indústria cultural e como formadora de uma consciência ideologicamente
deturpada, servindo aos interesses do capital de acumulação do lucro e de
manutenção hegemônica.
A criança,
neste sentido, tem tido um papel importante na reprodução do capital através do
consumo, tornado-se, assim, vítima de uma comunicação publicitária que alimenta
os sonhos de consumo e inebria as consciências de nossas crianças com uma
realidade velada, formando-as sob a lógica perversa do
consumo.
Entretanto, a riqueza de
possibilidades que este meio de comunicação possui nos alimenta a idéia de que a
TV pode servir a interesses educativos contra-hegemônicos, desde que o ensino
acerca desses veículos de comunicação de massa consista na apreensão do mesmo
por meio de categorias que desenvolva aptidões críticas e conduza as crianças à
capacidade de desmascarar ideologias. Para que isto se materialize, é essencial
que os professores tenham esclarecidas as concepções ideológicas vigentes na
sociedade, como estas se articulam aos meios de comunicação, o que é veiculado
pelos produtos da indústria cultural e ainda tenham condições de articular estes
conceitos a uma educação significativa relevante, democrática e emancipadora na
Educação Infantil.
Esta não é uma tarefa simples, pelo
contrário, confirma-se como um emaranhado complexo em que o ato educativo, mais
do que transmissão de bens culturais e científicos, é um ato eminentemente
político. Neste sentido, a criança também não se caracteriza como uma tábula
rasa pronta para ser preenchida de conteúdos culturais. Ao contrário disto, as
crianças são sujeitos históricos que modificam e são modificadas nas relações
com o mundo e com os outros, que produzem e consomem cultura.
Assim, a televisão na sociedade
capitalista é um veículo ideológico e de mercado. Entretanto, no processo
educativo, os alunos podem ser levados a elaborar análises críticas sobre os
conteúdos dos produtos culturais, tencionando e questionando-os no confronto com
a realidade. A TV pode tornar-se mais um instrumento educativo sem, no entanto,
substituir outros, como o brinquedo, os livros e as histórias.
A reflexão suscitada nesse texto,
longe de estabelecer conclusões apressadas sobre o tema, traz alguns pontos
importantes sobre a influência da indústria cultural e da televisão sobre o
universo cultural infantil e na formação de crianças de até 06 anos. Tais
contribuições podem nortear formas críticas de perceber a televisão como
possibilidade educativa na formação cultural de crianças, extrapolando o
laissez-faire frente à TV e a submissão à lógica de mercado e à ideologia
dominante imposta por esta, através de olhares criticamente embasados e
engajados em possibilidades democráticas e de qualidade para a Educação
Infantil.
Autor
[1] Professor de
Educação Física da rede estadual de ensino, especialista em Educação Infantil
FE/UFG e aluno do Mestrado em Educação Brasileira na Faculdade de Educação-
Universidade Federal de Goiás. E-mail: hgleofonseca@hotmail.com
Notas
[1] O conceito de infância como um
vir-a-ser é, como lembra Perroti (1984, p. 13), determinado pela sociedade
moderna, onde só é reconhecido o sujeito que, através da sua força de trabalho,
produza capital. Entretanto existiram outros conceitos de infância elaborados
historicamente, e até mesmo a falta de um sentimento de infância, na qual a
criança fora considerada um sujeito inanimado, corrupto ou um adulto em
miniatura.
Referências Bibliográficas
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W.. Educação e emancipação. São Paulo: Paz e Terra,
1995.
ADORNO, T. W.; HORKHEIMER, M.. Dialética do esclarecimento: fragmentos filosóficos. Rio de Janeiro:
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PACHECO, E.
D.. Infância, cotidiano e imaginário no terceiro milênio: dos folguedos
infantis à diversão digitalizada. In: PACHECO, E. D. (org). Televisão, criança, imaginário e
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PACHECO, E.
D. (org) Televisão, criança, imaginário e educação. Campinas: Papirus,
1998.
PERROTI,
E.. A criança e a produção cultural: apontamentos sobre o lugar da criança na
cultura. In: BELINKY, T,
(et.al.) A produção cultural para a
criança. Porto Alegre: Mercado
aberto, p. 09-27, 1984.
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